Sobre o verdadeiro pecado!

Sobre o verdadeiro pecado!
"O primeiro pecado da humanidade foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida." Carl Sagan

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Sobre “13 Reasons Why”.

Sobre “13 Reasons Why”.
Se teve algo útil que a “fama” que angariei há quase um ano trouxe para mim (pasmem!) foi a possibilidade de ser ouvida e de auxiliar inúmeras mulheres: desde a quebra de paradigmas, à necessidade de empoderamento e imposição de respeito perante machistas e misóginos fantasiados de “bons partidos”, até o conhecimento do feminismo e do quão importante a liberdade anímica é para a sua felicidade! 
Sendo “ouvida”, as crônicas do “Apenas Ideias: desabafos e terapia pelas palavras”, meu blog que está na rede desde 2007 passaram a ser procuradas, além dos tutoriais existentes no claudiademarchi.com.br, o que vem contribuindo positivamente para muitas irmãs de todas as “querências” e ofícios. 
É de conhecimento de todos os meus amigos íntimos que não uso o Facebook ou Instagram para exibir o que não sou ou ostentar “felicidade” quando não estou feliz. Sou transparente aqui na vida real e na virtual que, para mim, nada mais é do que a “real” na expressão escrita. O que muito me agrada, posto meu amor pelas letras!
Eis que ontem terminei de assistir a “13 Reasons Why” e conclui que precisamos falar sobre suicídio. Sim, precisamos! E sobre momentos ruins, crises existenciais, frustrações e inúmeros espinhos oriundos do convívio em sociedade que, devagar, porém frequentemente, nos fazem sangrar a alma. 
Algumas pessoas, como eu, de alma sensível e forte empatia, sempre esperam o mesmo do mundo: doçura, lealdade, empatia e compaixão. Mas, seguidamente a gente não encontra, costumeiramente vemos traição de confiança, amargor, egocentrismo e egoísmo. Existem fases em que, por mais que tentamos fazer de tudo para que “tudo” dê certo, nada dá! Sim, são fases, mas nem sempre temos alguém para nos abraçar, impulsionar e dizer: “Isso vai passar!”.
E os nossos pais? Neste ponto só eles não valem tanto, apesar do dialogo ser sempre essencial. Como eu, Hannah era única filha e, como a maioria das “únicas”, carrega consigo a obrigação de “dar orgulho”, de “não ser um fardo”, “um incomodo”. Aliás, esta vontade de fazer com que nossa família se orgulhe da gente é derivada da vaidade, algo tolo do qual a maturidade nos afasta, afinal, quem nos ama (familiares) deve rejubilar-se pela nossa felicidade e não porque estamos andando na linha que eles “riscaram” para nós. 
Enfim, conto-lhes uma história:
Em 2012 eu cheguei ao ápice do desgosto com a vida. Com o ser humano. Comigo. Com tudo. Procurei terapia e meu psiquiatra dizia (acertadamente) que eu estava passando por uma fase ruim (fase está que começou com o tortuoso, traumático e duro fim de um relacionamento abusivo ao final de 2010), mas que a medicação me ajudaria a passar por ela com mais “qualidade de vida”. Estava afastada da advocacia na minha cidade, pois morei fora quando casada. Retornando para Passo Fundo, fui trabalhar num escritório: ganhava uma ninharia, teve assédio, depois mudei de trabalho e tive uma colega que, de outras formas, me magoava. 
E os romances? Como sempre, os homens que conheci “caiam” na mesma intensidade que eu sempre “transpirei” e logo entabulávamos um relacionamento sério. Eu não estava bem comigo mesma, logo sumia. Sentia-me sozinha com eles e preferia a minha própria companhia. Não sentia a sua empatia, não me sentia compreendida e obter piedade nunca foi algo que eu quisesse (nunca será!).
Por conta das dores emocionais minha dor física na lombar (oriundas da discopatia degenerativa que tenho desde os 22 anos) era lancinante e não passava nem com Tramal e Codeína. Aquela sensação terrivelmente dolorosa de inutilidade era um reflexo da minha dor interior.
Em tudo o que fiz na vida eu dei o meu melhor e, na pele e na raça, porém não sem pesar, aprendi que meritocracia (“se dedique que você conseguirá tudo o que quiser”) existe no mundo juntamente com unicórnios cor de rosa. Você tenta, diariamente, você tenta! Estuda, ousa, mas se depara com o machismo, com o menosprezo (“Afinal, você é filha de quem?"), assédio de patrão, gente narcisista e cheia de “ego”, chefe ignorante e sem poder de liderança, mas com "boa lábia” e muita "astúcia" (para não falar desonestidade) menosprezando a sua inteligência. 
Enfim, teve um dia, ou melhor, existiram vários dias em que a vida me exauriu. Em que do ser humano só tive decepção. “Amiga” fofoqueira, quiçá invejosa. Outras extremamente autocentradas em suas vidinhas “quase perfeitas”. No fundo, a gente nasce só e vive assim, mas aprende, com a maturidade a ser feliz em solitude. Todavia a Hannah não viveu muito tempo para aprender isso! Ninguém ouviu seus pedidos de socorro para auxiliarem-na a passar pela fase ruim em que estava. 
Na minha vida eu encontrei muito mais do que 13 razões para desistir. E elas surgiram após o segundo grau, após a faculdade, após sucesso no exame da OAB (nos idos de 2005), após pós-graduação e etc., mas as razões surgiram. 
Eis que, em meio a tratamento para colocar o sono em dia e dar aquele “up” na serotonina, ciente que estava o médico de que era uma fase e ela passaria, ou seja, era mera tristeza, não depressão numa madrugada em que remédio algum me fazia dormir eu quebrei uma taça de cristal, cortei meu braço, tentei de todas as formas cortar meus pulsos, mas o cristal não “ajudava” e a coragem se foi, logo pensei: “Para minha mãe não sofrer tanto, vou engolir este cristal picado, vai rasgar meus órgãos internos e morrerei de hemorragia interna!” (Não entendo nada de Medicina).
Pois bem, piquei o cristal e, com certo desconforto engoli uma taça de vinho tinto grande! A dor dos cortes nos braços me fez dormir. Acordei no outro dia para ir ao trabalho que eu odiava. Eu estava (naquele momento pensei: infelizmente, viva!). Nada de anormal ocorreu. No trabalho, apesar da blusa de manga longa os cortes foram vistos e minha, então chefe, resolveu que eu deveria falar com minha mãe, que, até então, não sabia de nada.
Então fomos ao médico e veio à frase: “Cláudia, você precisa descansar. O mundo aqui fora não está lhe ajudando. É meu dever lhe internar, você está representando um perigo a si mesma.” Eis que, na mesma tarde, na ala particular do hospital psiquiátrico da cidade, cheguei. Sem telefone, notebook, nada. Uma espécie de prisão com horário pra tudo.
Conheci pessoas muito doentes, para evitar contato eu não descia tomar sol, mas malhava. Lia, bastante e conversava com quem não tinha nenhum distúrbio realmente incapacitante. Foram 20 dias de internação. Recebendo visitas diárias. Coincidentemente até meu pai- na época muitíssimo ausente- esteve por aquelas “bandas” e foi visitar a filha (que já se achava um “desgosto”) no hospital psiquiátrico. Senti-me péssima, mas a serenidade dele me animou.
Porque eu estou contando isso, agora? 
Porque se nós não nascemos mulheres, mas nos tornamos, como disse Simone de Beauvoir, fato é que não nascemos fortes, empoderadas, sapientes, emocionalmente inabaláveis, não nascemos “preparadas” para os revesses e para as constantes decepções que o mundo nos apresenta. Não nascemos preparadas para cruzar com as mais de “13 razões” para desistir que a vida pode nos oferecer. A gente se constrói, se cria, se faz, se supera e, ainda, se recria, se reinventa e segue adiante!
Então, você aí, adolescente ou não, homem ou mulher, gay ou hetero, trans ou travesti, dona de casa ou empresária, pobre ou rico, não se sinta só nesta vontade de sumir que às vezes lhe “bate”, saiba que você precisa operar mudanças na sua vida, agir, mudar-se, ousar, procurar um terapeuta e, aos poucos, reerguer-se porque, por mais cruel, estupida, vil e egocêntrica que seja a humanidade haverá sempre um brilho especial na vida! E este brilho será você, após se autoconhecer e superar os seus percalços! Todos, a exceção da morte, são superáveis! 
Acredite: você vai brilhar muito a ponto de sambar na cara de todas as “incontáveis razões porque” que esta vida, nem sempre boa, às vezes cruel e frustrante, irá lhe apresentar. Ou melhor, retifico: a vida é boa, a natureza é linda! Cruel, egoísta e frustrante é o ser humano, mas com a maturidade você vai aprender a manter-se longe da maioria destes seres, seguida e injustamente, denominados de “racionais”, mas incapazes de se colocar no lugar do outro. A raça humana falhou, isso é um fato! É impossível ter um pingo de sensibilidade e não se irresignar frente ao que vemos e ouvimos diariamente. Todavia, com o tempo você vai distinguir solitude de solidão e, então, não existirão razões para desistir de nada, apenas do convívio com quem não lhe faz bem, ainda que você cerque-se apenas de felinos!
Cláudia de Marchi
Brasília/DF, 10 de abril de 2017.